4 de jun. de 2009

Multimídia e inovação pedagógica

O futuro do trabalho escolar está na pesquisa metodológica

Eduardo Monteiro 2006

A presença maciça e crescente das tecnologias e linguagens de comunicação é uma característica constitutiva e marcante da sociedade atual. Não há lugar no planeta ou atividade da vida que não esteja afetada, de uma forma ou de outra, pela quantidade e variedade de dispositivos que acessam e armazenam informação, que permitem o contato entre pessoas e grupos, que “tocam” todo tipo de conteúdo. Grandes ou pequenas máquinas, complicadas ou fáceis de usar, caras ou populares, novas ou já obsoletas, seguem rapidamente mudando nossos hábitos, nossa forma de nos relacionarmos entre nós e com o mundo, nosso modo de ver e de entender as coisas a nossa volta.

O mundo do conhecimento, a cultura e os saberes sociais também mudam com essa dinâmica e, portanto, algo de novo vai acontecer com a escola e com aqueles que com ela têm alguma relação – professores, diretores, estudantes ou suas famílias. Se o mundo mudou, ainda que custe, a escola também vai mudar. Seja porque os estudantes trazem consigo inquietações e artefatos desse mundo de comunicação em que habitam, seja porque seus professores estão insatisfeitos e inquietos, sentindo a necessidade de incluir a escola e a si mesmos neste novo contexto, seja ainda porque seus gestores estão aturdidos, quebrando cabeças e paradigmas para promover este encaixe tão complicado entre escola e modernidade.

Inovação na escola: construção que depende de investimento

Há, sem dúvida, enormes possibilidades em perspectiva quando pensamos na presença das novas tecnologias nos ambientes escolares; quantas novas formas de interação com a informação e de construção de conhecimento já não estão acessíveis? Em diversas escolas há experiências bastante significativas, especialmente quando são frutos da mobilização e do empreendimento coletivo, vencendo a falta de recursos e articulando parcerias internas e externas. Se, além disso, o acesso às tecnologias for tomado realmente a sério, visto como um direito do cidadão que busca na escola seu lugar na sociedade da informação, então poderemos realmente sonhar mais alto. Presentes em cada escola, garantidas na trilha curricular de cada estudante ao longo de sua formação básica, quantas possibilidades de emancipação e desenvolvimento não podem trazer? Mas isso, como sabemos e temos visto, depende de muito investimento: em recursos materiais que instalem a modernidade fisicamente nas escolas e em soluções políticas que garantam equipamentos funcionando e a formação profissional e pedagógica dos docentes, que devem saber extrair desses recursos os benefícios educativos e sociais de que suas escolas e estudantes tanto precisam. Esse investimento é condição indispensável para incluir escolas - e com elas suas comunidades - no mundo da tecnologia, da informação, da cultura e do trabalho.

Mas há ainda um item fundamental e que, na maioria das vezes, passa desapercebido, talvez pelo deslumbre que a tecnologia provoca, ou talvez porque haja, também, fortes interesses de mercado e de política em convencer escolas e professores de que não há futuro fora da tecnologia. Isso pode ser verdade; porém só será verdade na medida em que a tecnologia estiver a serviço da educação e do desenvolvimento social e educativo que as escolas têm de gerar para a sociedade. É verdade que escolas com computadores, máquinas digitais de foto e vídeo, conexões de Internet e outros apetrechos são melhores e educam melhor? Talvez. Se os educadores souberem tirar dessas coisas vantagens para educar, sem dúvida poderá ser verdade. Porém, se não souberem, essas tecnologias caras podem ficar ociosas, virar sucata ou, pior, serem formas caras e complicadas das escolas fazerem o mesmo que fazem desde há um século...

Computadores, câmeras e outros eletrônicos que brotam no mercado diariamente têm pelo menos uma coisa em comum: um manual do usuário; e, neste manual, nenhum capítulo ou referência sobre como essas máquinas funcionam como instrumentos para ensinar e aprender melhor. E é aí que está o grande desafio e a grande oportunidade. Esta informação que falta precisa ser inventada, e não é difícil adivinhar que esta é uma tarefa para professores e pedagogos. Engenheiros, psicólogos, designers e comunicadores podem ajudar muito – afinal, a educação também já se abriu a esse modo interdisciplinar de fazer as coisas hoje em dia, inclusive ensinar. Mas são os especialistas em estudantes e escolas que devem liderar o processo de invenção das novas formas de ensinar para um mundo definitivamente novo.

O papel estratégico da pesquisa docente em serviço

O professor de hoje que atua com qualidade sabe que a educação mudou muito. Os educadores de hoje têm estudado muito os processos sociais e psicológicos que constituem a aprendizagem, e hoje já há bastante consenso de que diferentes pessoas, em diferentes contextos, aprendem de formas diversificadas, cada qual com uma modalidade que privilegia determinado tipo de estratégia cognitiva. A noção da diversidade de modalidades de aprendizagem se desdobra na percepção clara de que os espaços educativos devem promover a diversidade das formas de ensinar, se quiserem incluir os estudantes no processo. E a grande oportunidade criada pelas tecnologias de informação e comunicação é, justamente, a ampliação dessa oferta de possibilidades.

Diante disso, o professor se vê desafiado a ser criativo em termos de metodologia. Seja porque tem consciência de que os métodos tradicionais já não dão respostas satisfatórias, dado que uniformizam formas de aprender e de ensinar e, portanto, são potencialmente excludentes, seja porque sabe que seus alunos chegam de um mundo repleto de comunicação e que quase nunca se sintoniza com o modo de comunicar as coisas na escola.

É o professor que vai fazer, então, toda a diferença, podendo ajudar a escola a reencontrar sua função social. O professor inquieto, insatisfeito, que olha para sua sala de aula, para seu quadro de giz, para seu livro didático, senta, põe a mão na testa e pensa: “o que eu faço com isso?”. Esse professor que se sente “perdido” está, sem saber, dando o primeiro passo para se encontrar, reconstruir seu trabalho, sua identidade profissional e sua escola. Mas, é claro, não vai ficar sentado com a mão na testa o resto do dia: vai pesquisar e experimentar recursos, questionar e refletir suas práticas e experiências, ler e debater idéias e posições e vai, finalmente, entrar mais seguro em sala de aula.

A pesquisa docente é o único caminho para levar a escola a recuperar sua função na sociedade da informação. Gestores escolares e de redes de ensino precisam compreender sua importância estratégica fundamental e criar políticas para que professores estudem, pesquisem, desenvolvam metodologia e empenhem esforços para destinar a isso tanto ou mais recursos do que se está buscando para equipar as escolas. Porque os equipamentos sem a metodologia pedagógica só geram benefício para aqueles que os comercializam.

O professor que tem o privilégio – infelizmente, ainda é isso! – de ter os recursos em sua escola, tem responsabilidades e tarefas muito importantes. A principal delas é reconstituir o saber pedagógico, criando, a partir de suas inquietações, novas formas de educar para um mundo novo e que ficou bem distante da escola, que perdeu o bonde da história e não se atualizou.

A pesquisa docente é, portanto, um valor e uma prioridade para quem faz escola. E pode ser assumida a partir de pelo menos três pólos de procedimentos pelo professor ou pelas equipes docentes:


1. Contextualizar sua postura educativa e pedagógica, respondendo:

§ O que é necessário ensinar no contexto social e cultural em que atuo?

§ Como se aprende neste contexto?

§ Como (portanto) se ensina neste contexto?

§ Em que os recursos que tenho ajudam ou não ajudam no trabalho que tenho a fazer aqui?


2. Problematizar situações pedagógicas numa perspectiva experimental:

§ Quais os efeitos que quero obter com o uso dos recursos e materiais que planejei usar? E quais efeitos são indesejados?

§ Como irei avaliá-los? Que hipóteses tenho para seus resultados?

§ Após observar os efeitos de minhas experiências, quais explicações tenho para minhas observações, a reação de meus alunos e os resultados que obtive?

§ Como incorporarei os resultados de minhas observações ao meu planejamento?

§ Para atingir meus objetivos, que atividades e recursos podem me ajudar? E quais não podem? Por quê?


3. Estudar e discutir os temas educacionais relacionados com sua investigação em sala de aula:

§ Que autores, que textos dizem algo que pode me interessar?

§ E que autores estão dizendo coisas sem muito fundamento?

§ Quem de meus colegas pode ter algo a contribuir?

§ Posso escrever algo sobre o que tenho lido, experimentado e refletido?

Autor de seu próprio saber, o professor precisa conquistar uma nova autonomia para si e uma nova referência de atuação docente para sua escola. De forma que se deve buscar – gestores e docentes – uma cultura educacional e escolar que valorize o professor que estuda, aquele que, como diz Pedro Demo (1990), tem o que ensinar porque está em constante aprendizado e diálogo inteligente com a realidade. Até porque, na sociedade da informação, o que o professor tem de melhor a dar não é informação, mas o ensino das estratégias que desenvolve para chegar a ela, elaborá-la e construir conhecimento significativo. Esta cultura precisa ser o ambiente de significação das novas tecnologias nos espaços educativos, para que a escola não fique refém nem de suas limitações históricas, nem dos assédios do mercado, nem do fascínio deslumbrante de máquinas que são maravilhosas sim, mas, enfim, ainda máquinas que se só podem ser humanizadas pelo trabalho sensível e criativo de nossas mãos.

Bibliografia de base e de sugestão:

BELLONI, Maria Luiza. O Que é Mídia-Educação. Ed. Autores Associados, Campinas, SP: 2000.

CINELLI, Adilson .Comunicação e Educação: a linguagem em movimento. Ed. Senac, São Paulo: 1999.

DEMO, Pedro. Pesquisa: Princípio Científico e Educativo. Ed. Ática, S. Paulo: 1986.

FAZENDA, Ivani. C. Interdisciplinarida de: História, Teoria E Pesquisa. Campinas, SP: Papirus, 1994.

GUTIERREZ, Francisco. Linguagem Total. Ed. Papirus, São Paulo, 1978.

HERNANDEZ, Fernand. Transgressão e Mudança na Educação - Os Projetos de Trabalho. Porto Alegre, ArtMed, 1998

LÉVY, Pierre. Cibercultura. Ed. 34, Rio de Janeiro: 1999.

LÉVY, Pierre. As Tecnologias da Inteligência. Ed. 34, Rio de Janeiro: 1993.

Fonte: http://www.planetapontocom.org.br/midiaEducacao.swf

Um comentário:

Conceição Rosa disse...

Este texto é um achado! Valeu por recompartilhar (esta palavra existe? Em tempos de comunicação em rede, acho que sim...)