As mudanças são mais profundas do que muitos imaginam a primeira vista: mexem com a organização da economia, da política, dos serviços, da educação, da comunicação. Criam-se dois mundos - o físico e o digital - que se interligam, entrecruzam e complementam de forma inimaginável poucos anos atrás e que caminham para níveis de convergência muito superiores.
Estamos conectados em redes cada vez mais ricas, audiovisuais, inteligentes. As cidades tornam-se mais digitais: todos os serviços poderão ser acessados e solucionados de qualquer lugar, com qualquer tipo de tecnologia móvel e de forma mais econômica.
Apesar dos avanços nos costumes, na educação e nos valores, há um forte descompasso entre o avanço tecnológico e científico e o desenvolvimento pessoal e social. Temos tecnologias maravilhosas para usos relativamente banais e superficiais. É contraditório que milhões de pessoas acompanhem com atenção pessoas confinadas numa casa durante meses e que os transformem em celebridades ao menos por um tempo. Os serviços que mais crescem são os de pornografia e os de fofocas. Muitas pessoas se contentam com pouco, evoluem pouco, apesar do imenso potencial que possuem.
Quando vemos a vivacidade das crianças e o desencanto de grande parte dos adultos sentimos que algo se perdeu nessa caminhada. Que aprendemos tudo menos o principal: a gerenciar nossas pessoas, nossos grupos, nossas cidades, nossos países. Avançamos, mas podemos ir muito mais longe. A quantidade de pessoas depressivas, solitárias, desesperançadas atesta que ainda falta muito para termos uma sociedade sadia, realizada, solidária, participativa.
Estamos avançando. As novas gerações são mais inteligentes, mas crescem dentro de uma sociedade muito individualista, competitiva e que supervaloriza o ter, os bens materiais, a juventude, o corpo. A corrupção, o levar vantagem está disseminado em todas as classes sociais e fragiliza a convivência, a confiança, a esperança. Tudo aponta para uma sociedade melhor, mas não podemos esperar que isso irá acontecer por passes de mágica, por decisões de governantes messiânicos, por tecnologias avançadas.
Cada geração aprende um pouco com os erros das outras, mas continua cometendo seus próprios erros, porque todos somos muito contraditórios, cheios de tensões e insatisfações difíceis de preencher a longo prazo.
Mesmo com tantas demandas, avançamos muito mais devagar do que se imagina pelo peso dos costumes, hábitos, valores. Nossas idéias e expectativas são também muito mais ágeis do que nossas práticas. Há sempre um distanciamento grande entre os desejos e a ação. Tendemos a repetir processos, escolhas, procedimentos, na maior parte das vezes. Só quando estamos intimamente convencidos podemos dar um salto de qualidade na aprendizagem, nas escolhas, nas práticas.
Acreditamos que somos objetivos, que percebemos com isenção e julgamos sem paixão. Mas tendemos a procurar o que confirma nossas idéias, crenças e valores, procurar consonância afetiva e sentir-nos bem com nossas escolhas. Por isso é tão importante gostar de aprender, de conhecer, porque o conhecimento é o primeiro caminho para a mudança e se constrói a partir de constantes desafios e atividades significativas, que excitem a curiosidade, a imaginação e a criatividade.
À medida que criamos um ambiente de paz dentro de nós e ao nosso redor, evoluímos pessoalmente. A paz é um processo resultante de uma síntese equilibrada de vida: integrar o conhecimento, a afetividade e a ética; encarar de forma aberta a vida em todas as suas possibilidades e limitações; encontrar espaços profissionais estimulantes, e desenvolver relacionamentos maduros e profundos conosco e com pessoas significativas.
Mostramos em cada etapa de nossa vida o que verdadeiramente aprendemos pelo grau de humanização, paz e integração que atingimos e pela força da nossa comunicação como pessoas cada vez mais abertas, confiantes e humildes.
Evoluímos também pela construção de redes significativas de comunicação pessoais, grupais e sociais. Quanto mais ricas essas redes, mais chances teremos de aprendizagem e de realização como pessoas e mais úteis nos tornaremos para os grupos e organizações aos quais nos vinculemos e para a sociedade como um todo.
A educação equilibrada, integrada de cada um de nós e a aprendizagem a conviver com uma sociedade que equilibre mais o pessoal e o social, o material e o humano nos ajudarão a avançar pessoal e socialmente, a diminuir os desequilíbrios e desigualdades e a caminhar para uma convivência mais realizadora, progressista e justa. Não se fará isso em poucos anos, mas nos toca contribuir neste momento para que a desigualdade diminua e a realização aumente.
Estamos num período de mudanças complexas e fortes entre formas tradicionais de organizar o mundo e outras que ainda estão em implantação e que podem levar-nos a níveis mais ricos de conhecimento, de convivência, valores e realizações. Depende de nós.
* Trecho do meu livro Desafios na Comunicação Pessoal. 3ª São Paulo: Paulinas, 2007. p.239-242.
Um comentário:
Gosto muito de Moran, Robson!
Com certeza, depende de nós. Acho que tem a ver com uma frase de Rilke: “o futuro é fixo, nós é que vamos nos movimentando rumo a ele”. Dependendo do "movimento" que fazemos, moldamos o futuro que está a nossa frente...
Beijinhos
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