Adriana Toledo
Uma parceria estreita entre família e escola é determinante para o sucesso da aprendizagem de crianças e jovens. Mas qual é a visão dos pais sobre a Educação recebida pelos filhos, especificamente na rede pública? Para chegar à resposta, o Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial e a Fundação Victor Civita realizaram uma pesquisa de campo com 840 responsáveis por estudantes do1º ano do Ensino Fundamental ao 3º ano do Médio de escolas municipais e estaduais na capital paulista.
O estudo, divulgado em primeira mão por NOVA ESCOLA, mostra, entre outros pontos, que o ensino é visto como fator de mobilidade social. De acordo com Nilson Vieira de Oliveira, coordenador da pesquisa, os familiares sabem que precisam e querem acompanhar a qualidade da Educação, mas faltam-lhes meios para isso. Os governos poderiam identificar os pais mais atuantes e aproveitar seu potencial de mobilização para que envolvam os demais em programas de melhoria da escola, sugere. Outros seis temas se destacaram. Confira, a seguir, as principais conclusões.
Foto:Emília Brandão
''Fim um esforço para comprar um computador, pagar a internet e curso de computação para minhas filhas poderem pesquisar e ler notícias''. Jailda Oliveira, dona-de-casa, mãe de Mayara e Maely
1 Sim à inclusão digital
As lan-houses foram citadas por 12,6% dos entrevistados como sendo o local utilizado pelos alunos para estudar e fazer lição de casa e trabalhos, superando de longe a biblioteca escolar (4,5%) e a pública (3,3%). Para as famílias, a informatização tem extrema importância. De acordo com Patricia Mota Guedes, do Fernand Braudel, quando foi perguntado que atividades extra-escolares gostariam que a escola oferecesse, cursos de computação ficaram em primeiro lugar, com 36%, na frente de opções importantes como aulas de reforço em Matemática (11%) e em Português (9%).
Em casa, o acesso à informática está se expandindo: 35,6% dos entrevistados declararam possuir computador. A internet está presente em 27,1% das residências, como a da dona-de-casa Jailda Oliveira, mãe de Mayara, 12 anos, que está na 7ª série, e Maely, 14, que acaba de ingressar no Ensino Médio. "Eu e meu marido compramos um computador, assinamos um plano de internet e matriculamos as meninas numa escola para aprender a lidar com o equipamento", afirma. "Agora elas não precisam ir à lan-house para ler notícias e fazer pesquisas."
foto: Emília Brandão
''Já presenciei cenas de violência na escola das minhas filhas e me preocupo. Mandei uma carta à escola, mas a direção se sentiu ofendida''. Fátima Oliveira, dona-de-casa, mãe de Camila e Gabriela
2 A violência que preocupa
O estudo revela que esse problema é um dos que mais afligem os pais. A presença de policiamento está entre os três atributos mais importantes para uma boa escola, mencionada por 15,2% dos entrevistados. Reduzir a violência e a indisciplina é a segunda medida mais indicada (16%) entre as que deveriam compor as prioridades da rede. Entre os problemas mais lembrados estão agressão física e roubo ou furto. O impacto dos casos divulgados pela mídia contribui para aumentar o sentimento de medo, opina Vitor Paro, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo.
A situação apavora a dona-de-casa Fátima Oliveira, mãe da Gabriela, 14 anos, que cursa o 1º ano do Ensino Médio, e de Camila, 15, que está no 2º ano. A preocupação começou quando ela presenciou uma briga durante um campeonato escolar. Os garotos se agrediram verbalmente e depois partiram para a pancadaria. Não havia ninguém para apartá-los. Fátima escreveu à escola solicitando melhorias na segurança. "Infelizmente, a crítica não foi bem recebida pela direção, que se sentiu ofendida", lamenta.
3 O valor do bom professor
A pesquisa revelou um dado de extrema relevância: em geral, os responsáveis sabem os pré-requisitos para um ensino de qualidade. Sobre os atributos de uma boa escola, os mais valorizados foram professores que sabem ensinar (31,6%) e um diretor exigente (18,3%). Já no que se refere aos atributos do bom professor, o destaque foi para quem sabe explicar para que todos entendam (mencionado por 30,8% dos pais).
A comerciante Rosirene Melo Correa acompanha de perto o aprendizado do filho Alan, 11 anos, que está na 5ª série. "Eu vou à escola, pergunto aos professores a respeito do rendimento dele e sobre o conteúdo que está sendo ensinado", conta. Além disso, ela comparece a todas as reuniões e apresentações de teatro e música. "Eu também questiono se os professores ensinam bem, o que o Alan aprendeu e se tem dificuldades. Se necessário, mando bilhetes, pedindo que esclareçam dúvidas específicas."
Segundo a psicóloga e psicopedagoga Luciana Maria Caetano, que realizou na Universidade de São Paulo uma pesquisa sobre a relação entre a família e a escola, essa parceria deve ter como ponto de partida a própria escola. "Os professores são os especialistas em Educação. Cabe a eles iniciar a construção desse relacionamento. Os pais pouco sabem sobre as características do desenvolvimento cognitivo, afetivo, moral e social dos filhos, mas estão ansiosos para saber", afirma.
Outra orientação é aproveitar as reuniões de pais para tratar da proposta pedagógica e pedir sugestões, em vez de só discutir problemas de indisciplina.
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''Estou sempre informada sobre a vida escolar do meu filho. Participo de todas as reuniões e converso com ele sobre o conteúdo aprendido'' Rosirene Melo Correa, comerciante, mãe de Alan
Embora apenas 2% dos responsáveis entrevistados tenham concluído o Ensino Superior, 64,1% acreditam que os filhos ingressarão na faculdade e 13,3%, que farão pós-graduação. "Essa visão otimista se deve, provavelmente, à tradição de enviar os filhos à escola na perspectiva de que conquistem mais do que eles próprios", justifica Terezinha Rios, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e do Centro Universitário Nove de Julho. "Além disso, há a esperança de que a escola ofereça uma boa preparação para o futuro", completa.
O maior sonho da dona-de-casa Edna Araújo é ver as filhas Camila, 5 anos, e Mayara, 9, formadas na faculdade e com pós-graduação. "O estudo é o único bem que elas terão, garantido, para o resto da vida", justifica a mãe, ditando que as meninas construirão uma história diferente da dela, que teve poucas oportunidades de estudo. Edna já está guardando as economias para quando as duas entrarem na faculdade. "A expansão das vagas nas universidades particulares e a ampliação das bolsas oferecidas pelo governo federal e pelo Prouni afetaram positivamente as expectativas dos estudantes da rede pública", avalia Nilson Vieira de Oliveira, do Fernand Braudel.
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''Meu sonho é ver minhas folhas formadas e com pós-graduação no currículo. O estudo é o único bem que elas terão pelo resto da vida'' Edna Araújo, dona-de-casa, mãe de Mayara e Camila
5 O que assusta as famílias
O conteúdo aprendido em sala é o quarto item entre os assuntos mais abordados nas conversas com os filhos. Foi citado por apenas 14% dos entrevistados. São mais lembradas as drogas (17%) e as brigas (16%). Para Terezinha Rios, é compreensível. "É papel dos familiares perguntar se os jovens têm cuidado com algo sério como os entorpecentes."
Essa é justamente a maior preocupação da agente de saúde Creuza Fagundes, já que o problema existe onde estudam os filhos Paulo Ricardo, 17 anos, no 1º ano do Ensino Médio, Paula, 14, na 7ª série, e Patrícia, 12, na 5ª. "Alguns jovens fumam maconha e cheiram cocaína na porta da escola", diz. Sempre conversamos sobre esse assunto, e peço que eles nunca se envolvam com essas pessoas.
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''Converso muito sobre drogas com meus filhos. Sempre vejo jovens fumando maconhaou cheirando pó na porta da escola, e isso me angustia'' Creuza Fagundes, agente de saúde, mãe de Paula
6 Não à progressão continuada
A falta de informação das famílias sobre a Educação é evidenciada pelas respostas no que se refere à progressão continuada: 95% dos responsáveis são contra o sistema que prevê a organização do ensino em ciclos somente ao fim dos quais há reprovação. Os argumentos mais usados foram que os alunos são aprovados sem saber ler nem escrever e que a lei não estimula a estudar e passar de ano.
Para Vitor Paro, os resultados revelam que as famílias não sabem como a progressão funciona e a escola não explica. Por isso, muitos chegam a pedir que os educadores reprovem seus filhos. Quem realmente compreende o sistema o aprova. Cabe à escola, portanto, mostrar que o objetivo é permitir um tempo maior para a aprendizagem. Se dentro do atual sistema as crianças não estão sendo alfabetizadas, não significa que antes isso ocorresse. No passado, além de também não aprenderem, elas permaneciam na 1ª série por anos e, completamente desestimuladas e sem ambiente por terem colegas bem mais novos, acabavam desistindo dos estudos e aumentando os índices de evasão. A solução, portanto, passa pela capacitação dos professores para que todos sejam efetivamente beneficiados pelo sistema.
Quer saber mais?
Aqui, a íntegra da pesquisa conduzida pela Fundação Victor Civita e pelo Instituto Fernand Braudel
Contatos
Instituto Fernand Braudel, R. Ceará, 2,
01243-010, São Paulo, SP, tel. (11) 3824-9633, www.braudel.org.br
Luciana Maria Caetano, luma.caetano@uol.com.br
Terezinha Rios, te.rios@terra.com.br
Vitor Henrique Paro, vhparo@usp.br
Bibliografia
Qualidade do Ensino: A Contribuição dos Pais, Vitor Henrique Paro, 128 págs., Ed. Xamã, tel. (11) 5072-4872, 17 reais
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