13 de nov. de 2012

Recursos Educacionais Abertos

Débora Sebriam


Muitos ainda não ouviram falar, o nome pode parecer estranho para alguns, outros fazem algumas conexões, mas aos poucos, um número cada vez maior de pessoas e em especial os docentes das universidades e da educação básica, tomam conhecimento dos Recursos Educacionais Abertos.

O termo Recursos Educacionais Abertos (REA) foi estabelecido pela Unesco em 2002. A definição de REA, desde então, tem sido amplamente discutida e aprimorada por uma comunidade internacional que discute e cada vez mais cria projetos interessantes. Segundo a Unesco/Commonwealth of Learning (2011), “recursos educacionais abertos são materiais de ensino, aprendizado e pesquisa em qualquer suporte ou mídia, que estão sob domínio público, ou estão licenciados de maneira aberta, permitindo que sejam utilizados ou adaptados por terceiros. O uso de formatos técnicos abertos facilita o acesso e o reuso potencial dos recursos publicados digitalmente. Recursos Educacionais Abertos podem incluir cursos completos, partes de cursos, módulos, livros didáticos, artigos de pesquisa, vídeos, testes, software, e qualquer outra ferramenta, material ou técnica que possa apoiar o acesso ao conhecimento.”


Os REA possuem três elementos principais: conteúdos de aprendizado, ferramentas técnicas e recursos para implementação:

·         Conteúdo de aprendizado: são os conteúdos em si, como cursos completos, materiais de cursos, tópicos de um conteúdo, metodologias de ensino e aprendizado, exercícios, temas de aprendizagem, coleções, periódicos, etc.
·         Ferramentas: softwares para auxiliar a criação, entrega, uso e melhoria do conteúdo de aprendizagem aberto, incluindo busca e organização do conteúdo, sistemas de gerenciamento de conteúdo e de aprendizagem, ferramentas de desenvolvimento de conteúdo, e comunidades de aprendizado online.
·         Recursos para implementação: são as licenças de propriedade intelectual para promover a publicação aberta de materiais e das ferramentas, estabelecer princípios e localização de conteúdo, como indexação, arquivamento etc.

Para entender como um REA difere de um material disponibilizado na internet “gratuitamente” ou não, note que, os REA oferecem algumas liberdades aos usuários e essas liberdades podem ser definidas pelo autor, sem a necessidade de intermediários, e esse é um grande diferencial. As quatro liberdades mínimas dos REA, conhecida como os “4Rs” (review, reuse, remix e redistribute), são as permissões concedidas aos usuários que acessam esses recursos. São elas:

        Usar: compreende a liberdade de usar o original, ou a nova versão por você criada com base num outro REA, em uma variedade de contextos;
        Aprimorar: compreende a liberdade de adaptar e melhorar os REA para que melhor se adequem às suas necessidades;
        Recombinar: compreende a liberdade de combinar e fazer misturas de REA com outros REA para a produção de novos materiais;
        Distribuir: compreende a liberdade de fazer cópias e compartilhar o REA original e a versão por você criada com outros.

Essas permissões são dadas aos potenciais usuários, quando o autor da obra especifica uma licença flexível para o material. Essa licença pode ser especificada em um termo de uso, ou alguma outra conhecida, como as do Creative Commons, que oferecem 6 tipos de licenças e são reconhecidas mundialmente.
As possibilidades são inúmeras se partirmos da compreensão de REA como bens educacionais essenciais ao usufruto do direito de acesso a educação e a cultura. Recursos Educacionais Abertos podem facilitar o acesso ao conhecimento às pessoas que estão nas escolas e universidades e as que estão fora delas; incentivar práticas de colaboração, participação ativa da comunidade e compartilhamento; é uma forma de ter melhor aproveitados os investimentos públicos investidos em material didático; garantem liberdade, inovação metodológica e criatividade de produção; é uma maneira de valorizar e reconhecer o professor como autor.

As discussões sobre o tema estão florescendo no Brasil e as iniciativas tem se multiplicado. O cenário atual é muito positivo e distinto de 2008, quando o Projeto REA foi fundado no Brasil. É um dos primeiros projetos no Brasil que tenta aproximar a realidade e às perspectivas brasileiras a discussão internacional acerca de REA e da Educação Aberta. Desde então, uma comunidade ativa e crescente, que hoje conta  com mais de 600 pessoas voluntárias ajudam a consolidar a discussão sobre REA no Brasil através de uma lista de emails, um grupo no Facebook, através do Twitter e em eventos presenciais que se tornaram cada vez mais frequentes em 2011-2012. A comunidade REA Brasil é formada por professores da educação básica e universitários, estudantes de graduação, profissionais de TICs, participantes de movimentos sociais que trabalham com educação fora da escola, advogados, analistas de sistemas, engenheiros, profissionais da da área da saúde.

Entre algumas iniciativas brasileiras, podemos citar o Projeto Folhas, uma política educacional do governo do Estado do Paraná entre 2003-2010. Nesse projeto, o professor se candidatava para participar e ao ser selecionado, recebia licença remunerada e ponto na carreira para pesquisar sobre REA com apoio de especialistas. No final do processo, publicava o estudo em livro que também ficava disponível online e chegava à escola com o nome do professor na capa. A Educopédia, promovida pela Secretaria Municipal de Educação do Rio, é uma plataforma online colaborativa de aulas digitais, que podem ser adaptadas, compartilhadas e remixadas. O recém-lançado Scielo Books, onde as editoras universitárias disponibilizam livros acadêmicos em diferentes formatos e com licenças abertas. Organizações não-governamentais como o Instituto Paulo Freire e o CENPEC também tem os seus projetos de disponibilização de material em REA. Colégios particulares do município de São Paulo, como o Porto Seguro, Dante Alighieri e o Centro Educacional Pioneiro que criou um projeto piloto e começa a dar seus primeiros passos, também participam desse movimento.

Entre as iniciativas públicas, temos o Portal do Professor do MEC, um portal destinado aos professores da rede pública, contém não apenas recursos educacionais, mas também notícias sobre educação, links de apoio e ferramenta de criação de aulas online. A ideia é ótima, entretanto, muito material depositado no portal está regido pelas leis do copyright. O repositório acaba se tornando confuso, pois cada objeto educacional depositado tem sua própria norma em relação a direitos autorais. Alguns adotam alguma licença do Creative Commons, mas outros apresentam nota dizendo que todos os direitos estão reservados. O mesmo problema ocorre com o portal Domínio Público, apesar do nome, nem todos os materiais disponíveis são de fato de domínio público, o que pode gerar confusão e insegurança no usuário. Existem outras inúmeras iniciativas que podem ser encontradas na seção REA no Brasil e no Mundo no site REA.


A grande missão do REA Brasil é prover informação e inovação em política pública de educação. Uma das maneiras de garantir o acesso à educação, a materiais de qualidade e permitir inovação metodológica é por meio de Políticas Públicas que apoiem os REA e determinem que todo o investimento público na compra ou desenvolvimento de recursos educacionais deve dar preferência a Recursos Educacionais Abertos. Tais políticas também se justificam pelo fato de que o direito constitucional à educação não apenas fundamenta a dignidade e a cidadania, mas confere ao cidadão seu potencial humano. Para tanto, atuamos apoiando o trabalho de decisores políticos na construção de políticas públicas e legislação que garantam o acesso aos recursos educacionais resultantes do investimento público direto e indireto.

Nesse sentido, alguns avanços significativos tem ocorrido desde 2011. Tivemos a aprovação de um decreto municipal na cidade de São Paulo, que adotou políticas de REA. Desde 2011, todo material didático produzido pela Secretaria Municipal de Educação é registrado sob licenças flexíveis e está disponível online. Prefeituras menores, sem verba para produzir material do zero, têm usado o material, incentivando seus professores a alterar a produção e adaptá-la para a realidade local.

O Projeto de Lei Estadual de São Paulo 989/2011, já foi aprovado em 3 comissões e a conversa com a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo está se estreitando e começando a gerar frutos. Existe também o Projeto de Lei Federal 1513/2011, que foi aprovado na Comissão de Educação e atualmente diversos representantes da sociedade civil, universidades, legislativo começaram a se reunir para escrever um PL substitutivo. E por último, REA foi contemplado no Plano Nacional de Educação nas metas 5 e 7.
O conceito REA é novo não só no Brasil e ainda há muito por fazer. Há necessidade de um grande trabalho para que a cultura colaborativa e de compartilhamento por meio da internet e dos REA seja vista como algo positivo. Muitas vezes, projetos têm como objetivo gerar recursos livres e práticas colaborativas, como é o caso do Portal do Professor do MEC, mas acabam falhando na adoção de políticas claras de como os usuários podem, de fato, utilizar e apropriar-se de tais materiais. Existe também a questão de formação de professores em exercício e a inserção do tema nos cursos de formação de professores. Ademais, no Brasil, as editoras possuem grande poder econômico, político e de mídia, como vemos há alguns anos ao redor do debate das cópias dos livros e da reforma de lei de direito autoral. Tais atores econômicos ainda têm muito receio em relação à sustentabilidade de práticas REA e como tais práticas vão afetar seu poder de mercado. Por isso, nós do Projeto REA também tentamos estudar e gerar conhecimento sobre novos modelos de negócio que podem gerar sustentabilidade para as editoras. Ainda estamos caminhando para o aprofundamento desse debate.

A meu ver, no Brasil, as práticas REA têm surgido de indivíduos que levam suas ideias para suas instituições, que reconhecem REA como parte de sua função social de geração e publicação de conhecimento e pesquisa. É um começo e um começo importante, uma vez que, sabemos que políticas públicas só funcionam efetivamente quando tem o apoio da sociedade.

Saiba mais sobre REA, projetos no Brasil, projetos em outros países, políticas públicas em rea.net.br.

Faça parte da comunidade REA Brasil! Traga suas práticas, dúvidas e apoio para o grupo:

Sobre a autora: Débora Sebriam, Mestre em Engenharia de Mídias para a Educação – Universidade Técnica de Lisboa – Portugal, Université de Poitiers – França e Universidad Nacional de Educación a Distancia – Espanha. É coordenadora de projetos do Instituto Educadigital, gestora de comunicação do Projeto REA Brasil, especialista em tecnologia educacional no Centro Educacional Pioneiro. Atua principalmente com integração de tecnologias ao currículo, tecnologias e formação de professores, desenvolvimento de projetos, gestão de mídias sociais, Recursos Educacionais Abertos, Uso Seguro das Telas Digitais. E-mail: deborasebriam@gmail.com / Redes Sociais: Facebook: facebook.com/deborasebriam / Twiitter: @deborasebriam

Um comentário:

Unknown disse...

Oi, Débora!
Em primeiro lugar, parabéns pelo trabalho desenvolvido por ti e pela comunidade REA Brasil!
Estou, aos poucos, me aproximando do conceito de REA, gosto muito da ideia dos "Erres": usar, aprimorar, recombinar, distribuir.
Aliás, acho que é um pouco essas ideias que tento debater com minhas alunas, futuras professoras.
Tenho aprendido muito com vocês!
Obrigada!