21 de jun. de 2010

O que é (afinal) a Web 2.0?

Daniela Bertocchi*

A expressão “Web 2.0” está por todo lado. Encontramos este epíteto em notícias de jornais e revistas, programas de rádio e televisão, sites informativos e de entretenimento. Jornalistas, especialistas em tecnologia, acadêmicos do ramo da informação e comunicação, investidores em web e professores das mais diversas áreas invocam-no cada vez com mais frequência.

Mas, afinal, o que querem dizer com Web 2.0? E mais: Por que falam tanto sobre isso?

Em primeiro lugar, é bom deixarmos claro um ponto: não há consenso sobre o que seja a Web 2.0. Na verdade, ao lermos as notícias e reportagens veiculadas pelos meios de comunicação social e também ao termos contato com os textos acadêmicos sobre o assunto, encontramos duas perspectivas distintas sobre o que seja a tal Web 2.0. A primeira ressalta-a como a fase da “idade de ouro” da Internet. A segunda, mais crítica, considera o conceito “pura estratégia de marketing empresarial”.

O discurso mais comum é sem dúvida o primeiro, aquele que ressalta o poder revolucionário da Web 2.0. A expressão, para este caso, faz alusão à época em que uma série de novos sistemas e ferramentas digitais estiveram ao alcance dos utilizadores de Internet para que estes sentissem o sabor do poder da criação e da participação online. A idéia, aqui, é basicamente a de que houve uma passagem do predomínio das grandes empresas tradicionais de software (como a Netscape ou a Microsoft) para o advento das empresas prestadoras de serviços na Internet, tipo Google e YouTube, fazendo desviar o centro de influência do computador pessoal para a rede enquanto plataforma.

As críticas com relação à Web 2.0, por outro lado, são menos freqüentes, mas nem por isso menos importantes, e permanecem centradas no argumento de que tal conceito nada mais é do que uma velha idéia repaginada para funcionar como estratégia de marketing empresarial para ganhar mais adeptos – jovens, sobretudo, que formam a grande audiência da Internet. A Web 2.0, aqui, significaria nada além de uma evolução natural da web, sem todo esse glamour que costumam conferir à expressão.

Então, com o que ficamos: revolução inesperada ou evolução natural? Ou simplesmente nem uma coisa nem outra?

O que vamos apresentar a seguir são as principais idéias daquele que criou o chavão Web 2.0 e desenvolveu uma ampla conceitualização sobre o assunto: Tim O’Reilly, dono da editora de tecnologia O’Reilly Media, Inc. As explicações do especialista evidenciam o poder mais revolucionário da Web. Vejamos o porquê em sete pontos:

1. A Web como plataforma

As relações ocorrem na Web. Um dos pilares de desenvolvimento da Web 2.0 é a emergência de uma nova geração de tecnologias e de padrões depositando menos ênfase no software como pacote licenciado e distribuído, de instalação local no computador pessoal, e mais como uma aplicação fornecedora de um serviço, mas sedeado na Web. Enquanto, anteriormente, as aplicações de software corriam localmente na máquina do utilizador, suportado por um sistema operativo de computador pessoal, no caso da Web como plataforma a panóplia de serviços de software são acedidos pela janela do browser, comunicando através da rede com os servidores remotos onde as aplicações estão alojadas.

2. O “beta” perpétuo

Tudo está em constante melhoramento. Como o serviço corre centralmente e está permanentemente em curso na própria plataforma Web e não na máquina-cliente do utilizador, a gestão, melhoramento e evolução da aplicação registra tempos de intervenção muito curtos e próximos entre si. A monitorização constante sobre a aplicação, por parte da empresa que desenvolveu a solução informática, permite o seu melhoramento continuado com base nas respostas dos utilizadores à qualidade e desempenho do serviço, permitindo incorporar essas reações para a melhoria sucessiva do produto, sugerindo que ele nunca atinja o estádio acabado, mas sempre aperfeiçoável, daí a expressão do “beta perpétuo”. O inverso ocorre com os pacotes de software proprietário e licenciado, como o sistema operativo Windows e o pacote Office, ambos da Microsoft, por exemplo, com renovação periodicamente mais espaçada (a recente versão do sistema operativo Vista espaçou em sete anos a precedente) e através de campanhas de lançamento público no mercado à escala mundial.

3. A “inteligência” coletiva

Várias cabeças pensam melhor. É a expressão fulcral de todo o conceito e aquela que representa a maneira como os serviços são atualmente implementados de modo a facilitar a participação dos utilizadores, isto é, com poucos obstáculos à utilização, e recolhendo ensinamentos da participação coletiva designado pela expressão muito cara à Web 2.0 de “arquitetura da participação”. Ao agir individualmente, mas interpretada no conjunto, as decisões de cada utilizador contribuem reciprocamente para a melhoria da aplicação ou do serviço pela monitorização constante das interações entre utilizadores, recolhendo o feedback gerado para benefício global. Isso ocorre no Google, Amazon, BitTorrent e eBay. Também se entende, neste contexto, o rápido desenvolvimento das aplicações de carácter social, como o MySpace, o Messenger MSN, ou o Second Life, por exemplo. Todos, em conjunto, partilham o fato de a qualidade do serviço oferecido melhorar com o aumento do número de intervenientes, no qual exista alguma forma de interação coletiva.

4. O “culto do amador”

Qualquer um pode produzir. Muito tem se falado do fenômeno dos conteúdos gerados pelo utilizador na dimensão em que os mesmos são donos das informações que fornecem. Existe um conjunto de serviços baseados na Web demonstrativos desse conceito: os blogs, os wikis, um conjunto de funcionalidades que permitem acrescentar mais-valias na forma de comentários ou na colocação de uma anotação que permite categorizar o conteúdo em questão, no caso do primeiro, ou a edição fácil dos conteúdos da enciclopédia colaborativa, no outro caso. Uma das maiores áreas de desenvolvimento foi a dos serviços que permitem o armazenamento e a partilha de conteúdos multimídia: casos do YouTube, para o vídeo, do Flickr, para as fotos, entre outros exemplos. Estes serviços populares assentam na idéia da Web interventiva, na qual os utilizadores não são meros consumidores mas também contribuintes ativos na produção de conteúdos Web, a uma escala massiva: literalmente, milhões de pessoas participam na publicação e partilha de diversos formatos multimídia, produzindo os seus próprios arquivos de podcast, vídeos, fotos e texto, possibilitado pela ampla dispersão da tecnologia digital de qualidade suficiente e de baixo custo nos dispositivos digitais de fotografia, vídeo, celulares (vulgo “de terceira geração”, com lente fotográfica incorporada), aos PDA’s, aos computadores portáteis, consoles, entre outros, como já referido anteriormente.

5. Tagging e Social Bookmarking

Um tag é uma forma de anotação por meio de palavras-chave adicionadas a um objeto digital de modo a descrevê-lo, constituindo um sistema de metadados sobre recursos eletrônicos, e normalmente integrando um sistema de classificação formal, sem redundância e de aplicação universal – taxonomia. Uma das primeiras utilizações em larga escala de tags em ambiente web foi observada com o serviço Del.icio.us., fundado em 2003 por Joshua Schachter e agora parte integrante do grupo Yahoo!, que permite congregar de modo simples e acessível tudo o que de interessante um utilizador encontrou enquanto navegava na web, descrever com tags esses sítios e poder partilhar a sua coleção de favoritos (bookmarking) com a comunidade. Contudo, os utilizadores do serviço utilizam um gênero de tagging apoiado em vocabulário pessoal, livre e espontâneo, para usufruto próprio, sem revelar grande preocupação com a categorização ordenada, mas antes com o intuito de atribuir um significado familiar a um dado conteúdo, em registro informal, portanto. Este conceito de folksonomy foi sendo adequado a outros serviços, como o Flickr (fotos), o YouTube (vídeos) e o Odeo (podcasts), que gradualmente prefiguraram um fenômeno de “social bookmarking”: uma variedade de artefatos digitais anotada em ambiente social pode conduzir ao mapeamento dos interesses comuns e de vocabulário similar entre utilizadores, constituindo, em última instância, uma espécie de filtro social.

6. Dados em escala massiva

A Era da Informação produz quantidades siderais de dados. As empresas Web 2.0 afirmam poderem lidar com esta situação. Estas empresas têm como negócio principal a gestão das bases de dados e das redes, e desenvolveram a capacidade de recolher e gerir os dados em escala massiva. As aplicações são cada vez mais movidas pelos dados. Um dos melhores exemplos deste sucesso é a Google, que possui uma base de dados global na ordem das centenas de petabytes. A maneira de tirar proveito desses dados está na base do sucesso de companhias como a Google, a eBay e a Amazon: em comum, desenvolveram serviços que “aprendem” com as utilizações diárias, combinando-as com milhões de outras opções protagonizadas por outros tantos utilizadores, produzindo, no final, recomendações sustentadas sobre produtos. A disponibilização dos dados para aproveitamento dos investidores permite recombiná-los de diferentes formas e proveitos, naquilo que é considerado como Open API’s – Application Programming Interfaces.

7. A Longa Cauda (“Long Tail”)

A “Longa Cauda” representa, objetivamente, um gráfico de distribuição de freqüências combinando a variável independente “freqüência” com a variável dependente “posição (ranking)”, e refere-se, sobretudo, a empresas e produtos de vanguarda que acolhem a preferência da maioria dos utilizadores, situados à cabeça, prolongando-se a cauda, depois, progressivamente em direção ao zero, sem, contudo, o tocar, com referência aos itens de menor interesse. Tal é demonstrativo que, sem impedimentos físicos (como, por exemplo, a inexistência de condições para albergar produtos), e com os benefícios do armazenamento digital (que, como se sabe, cada vez padece menos de limitações de espaço), qualquer produto terá sempre possibilidade de ser encontrado e vendido.

* Jornalista, mestre em Ciberjornalismo pela Universidade do Minho (Braga, Portugal), instituição em que ministra aulas de Jornalismo. É pesquisadora-colaboradora do Núcleo de Jornalismo, Mercado e Tecnologia, da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo.

Obs.: Texto editado e resumido. Original: SÁ, Alberto & BERTOCCHI, Daniela. "A Web 2.0 no ano de 2006", In: Pinto, Manuel (org.), Anuário Mediascópio 2006, Centro de Estudos em Comunicação e Sociedade (CECS/ICS), Universidade do Minho, 2007.

Fonte: http://www.educarede.org.br/educa/index.cfm?pg=internet_e_cia.informatica_principal&id_inf_escola=653

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