8 de dez. de 2008

Juno - Os dilemas da Gravidez na Adolescência

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Gravidez precoce. Atividade sexual na adolescência. Dois temas polêmicos e bastante espinhosos para se trabalhar no âmbito escolar. Deve-se frisar, no entanto, que são situações que se configuram aqui, lá, acolá... Ou seja, não existe país, região, cidade ou escola onde algum caso relativo a essas situações não tenha sido verificado. Fechar os olhos ao fato é, certamente, o que não devemos fazer.

E como lidar com isso? Certamente o caminho inicial passa pelo acesso a informação, ou seja, trabalhar a questão em casa e na escola com naturalidade, serenidade e, em especial, critério. Partir do princípio que os jovens estão iniciando sua vida sexual de forma precoce, estimulados pelos meios de comunicação e pelo farto acesso a informação, entendendo-os como sexualmente ativos já aos 15 ou 16 anos [quando não antes disso, como já verificado] também faz parte do caminho a ser trilhado nessa orientação a ser dada pelos pais e professores.

Isso quer dizer que devemos aceitar essa situação e que não há como redirecionar essa prática sexual precoce, tentando fazer com que esta situação se estabeleça quando for atingida a juventude, numa faixa etária acima dos 18 anos [no mínimo]?

Não é isso o que estou dizendo... A educação a ser dada quanto a sexualidade, tanto pela família [que tem que necessariamente assumir o compromisso de falar sobre sexo com os filhos e não deixar que os mesmos aprendam nas ruas] quanto pela escola, deve informar sobre o que é, conseqüências, responsabilidades, precauções, questões relativas a saúde e, também, trabalhar com os pré-adolescentes e adolescentes no sentido de orientá-los a iniciar sua vida sexual quando atingirem uma idade e maturidade maiores.

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Devemos estar conscientes quanto ao fato de que ações como estas podem ajudar a resolver situações delicadas como a gravidez precoce e, mesmo, abortos praticados por meninas que ainda mal atingiram a puberdade. Apesar disso, temos que ter ciência que isso não elimina por completo o problema, atenua e remedia, evita a propagação e auxilia no futuro desse público-alvo. [Uma gravidez precoce, como sabemos, pode impedir a continuidade dos estudos, levar o adolescente ao mercado de trabalho também de forma antecipada, causar dificuldades financeiras no âmbito familiar...].

Nesse sentido, “Juno” é uma obra cinematográfica singular e importante que trabalha essa temática e que, com certeza, pode facilitar o diálogo dos pais com os adolescentes sobre sexualidade e indicar caminhos e ações para projetos a serem desenvolvidos nas escolas.

Seu principal trunfo é não trabalhar a situação como um drama ou dilema existencial para a adolescente e a família e, ao não dar contornos tão complexos e complicados a sexualidade e a gravidez precoce, propõe uma leitura mais leve, natural e não-agressiva dos fatos. Essa suavidade é, inclusive, temperada com um pouco de humor e, com isso, o que deveria ser um filme “difícil de engolir” por sua temática, torna-se uma obra que figura entre as melhores produções do cinema independente nos últimos anos.

Creio, porém, que a apresentação desse filme [classificado no Brasil como adequado para crianças com 10 anos] deva ser feita sempre com acompanhamento familiar ou educacional, para que casos como alguns registrados pela mídia, que dão conta de grupos de meninas adolescentes norte-americanas, de diferentes estados ou regiões [como noticiado em relação a 17 adolescentes de Massachussetts, com idade máxima de 16 anos], que resolveram engravidar e assumir a condição de mães solteiras, não se repitam... Ou seja, para que os ensinamentos e possibilidades surgidos com essa produção [Juno], não se tornem feitiços contra os feiticeiros...

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O filme

“Juno”, direção do diretor Jason Reitman é um filme surpreendente. E a afirmação que faço refere-se a praticamente todos os seus quesitos. A começar pela temática, bastante difícil, a sexualidade adolescente, aflorando a flor da pele pela explosão dos hormônios que ocorre entre os 13 e os 17 anos. Se não bastasse isso, há também a questão da gravidez na adolescência, abertamente trabalhada, mostrando bem como é a cabeça de uma garota de 16 anos que espera um bebê sem ter nenhuma vontade de ser mãe… Temas tabus, trabalhados de forma pouco convencional, com diálogos francos e abertos, a partir do ponto de vista das garotas, sem apelar para o humor grosseiro ou para a estupidificação.

O elenco então merece palmas, da protagonista Ellen Page, que já havia mostrado talento no suspense “MeninaMá.com”, como a independente garota Juno, descolada, antenada em rock dos anos 1970/80, fã de filmes de terror de Dario Argento e, como toda adolescente, dona da razão; passando pela bela Jennifer Garner, aparentemente bem casada e que tem dificuldades para engravidar; por Michael Cera, como o adolescente meio nerd, bom na escola, nos esportes, na guitarra e que se envolve intimamente com Juno de forma mais do que casual (apesar da evidente paixão que nutre pela garota); passando ainda pelos pais de Juno ou pelo indeciso Mark (protagonizado por Jason Bateman), o marido quase perfeito da personagem de Jeniffer Garner…

Filme de baixo orçamento (7,5 milhões de dólares, uma bagatela para os padrões do cinemão norte-americano), com roteiro pra lá de inteligente, interpretações de primeira, tema diferenciado (para dizer o mínimo), “Juno” é uma experiência cinematográfica inovadora por nos fazer acreditar que aquilo que vemos realmente está acontecendo e não que esses personagens ou a história sejam inverossímeis…

Parece alguma coisa que pode acontecer na vida de qualquer um dos espectadores, na casa do vizinho, na vizinhança ou com alguém da família. É ver para crer!

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Para Refletir

1. A sexualidade é um tema espinhoso para os pais e a escola. Trata-se de uma questão que deveria ser encarada com maior naturalidade e, ao se trabalhar o tema com adolescentes, não se deve, para começo de conversa, encará-los como ignorantes quanto ao assunto. Abertura e diálogo são encaminhamentos que demonstram para esse público o respeito e a atenção que eles merecem. Além disso, as orientações e informações não devem se restringir aos estudantes e, sim, estender-se também para as famílias.

2. O trabalho sobre sexualidade não deve se ater as disciplinas da área de ciências. É importante que, em paralelo, através de textos e materiais específicos para adolescentes, outras áreas do conhecimento contemplem o assunto. Por exemplo, dados estatísticos sobre gravidez precoce e suas conseqüências para os adolescentes podem ser apresentados em matemática, textos literários acerca da questão seriam usados em aulas de português ou redação...

3. Para dar maior seriedade e credibilidade ao debate sobre sexualidade e gravidez é sempre importante reforçar o trabalho na escola com a visita de especialistas como médicos, psicólogos ou sociólogos [por exemplo], que possam falar cientificamente, trazendo dados e informações de quem trabalha diretamente com essas situações no cotidiano.

4. O filme “Juno” nos apresenta a uma situação diferenciada daquela que vivemos em terras brasileiras até mesmo pela situação sócio-econômica da protagonista e, principalmente, em virtude da adoção de seu bebê por um jovem casal. Buscar informações sobre a realidade da gravidez precoce no Brasil, ampliar o debate e incluir questões que se avizinham, como o aborto ou a adoção de crianças, são premências quando o filme for apresentado na escola.

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Ficha Técnica

JUNO

País/Ano de produção: EUA/Canadá/Hungria, 2007
Duração/Gênero: 96 min., Comédia/Drama
Indicação Etária:10 anos
Direção de Jason Reitman
Roteiro de Diablo Cody
Elenco: Ellen Page, Michael Cera, Jennifer Garner, Jason Bateman, Allison Janney, J.K. Simmons, Olivia Thirlby, Eillen Pedde, Rain Wilson, Daniel Clark.

Links
http://epipoca.uol.com.br/filmes_detalhes.php?idf=18876
http://www.adorocinema.com/filmes/juno/juno.asp
http://www.cinemaemcena.com.br/ficha_filme.aspx?id_filme=4920&aba=detalhe

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João Luís de Almeida Machado Editor do Portal Planeta Educação; Doutorando em Educação pela PUC-SP; Mestre em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (SP); Professor Universitário e Pesquisador; Autor do livro "Na Sala de Aula com a Sétima Arte – Aprendendo com o Cinema" (Editora Intersubjetiva).

Fonte: http://www.planetaeducacao.com.br/novo/artigo.asp?artigo=1275

Um comentário:

Conceição Rosa disse...

O professor de Ed Física, tomou a iniciativa de desenvolver no turno noturno um projeto que tratava de sexualidade. Sua motivação foi o comportamento de risco que via em grupos de adolescentes com os quais trabalhava e convivia. Esse trabalho iniciou-se em 2007 e também foi desenvolvido em 2008, com todas as turmas do turno. Nossa surpresa foi o nível de participação também dos adultos, o tipo de perguntas que faziam e os comentários com que nos procuravam depois... Informação sobre sexo e sexualidade nunca são demais, mesmo para os adultos - esses, que têm filhos adolescentes e muitas vezes por desinformação ou padrão cultural, não sabem como tratar o tema com os jovens. A dica do filme vale para darmos continuidade ao trabalho anexando novas formas de abordar o tema.