O Sonho de Prosperidade no Sul Maravilha
As migrações que ocorrem regularmente no Brasil são a prova mais cabal da imensa desigualdade regional de nosso país. Que outro motivo levaria famílias inteiras a abandonarem suas cidades e estados de origem para se aventurar a milhares de quilômetros de suas famílias e amigos em busca de trabalho e melhor condição de vida? Somente a falta de oportunidades pode explicar tão constantes deslocamentos populacionais...
E quando falamos em oportunidades buscadas por milhares de pessoas todos os meses, ocasionando em especial a vinda de um enorme contingente de pessoas do Norte e Nordeste para o Sul e o Sudeste do Brasil, abordamos a questão dos investimentos, da infra-estrutura urbana, das possibilidades de acesso à saúde e educação de melhor qualidade, a concentração de renda em alguns estados da união, a maior força e influência política desses estados abastados nas discussões travadas em Brasília...
O Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre e tantas outras importantes cidades brasileiras localizadas no Sul e no Sudeste do país, são consideradas como autênticos “eldorados” para uma enorme quantidade de migrantes que atravessam o país em condições totalmente precárias e indignas em muitos casos. São homens, mulheres, crianças e idosos que se acomodam na boléia de caminhões ou que sacrificam todas as suas economias para adquirir passagens de ônibus e vir para o “sul maravilha”.
O que certamente não sabem é que as condições dos centros para os quais estão se deslocando também são difíceis. Não há acomodações adequadas e a vinda desses migrantes ocasiona o inchaço de periferias e favelas sem os recursos mínimos para uma boa qualidade de vida (faltam água, esgoto, escolas, postos de saúde, asfaltamento das ruas, iluminação pública, rede elétrica regularizada, segurança,...).
O emprego é outro artigo em falta. A situação torna-se ainda mais desesperadora quando o candidato a uma vaga de trabalho possui um baixo nível de escolaridade e informação, caso da maior parte desses milhares de migrantes que se deslocam pelo país todos os anos.
“O Caminho das Nuvens” aborda uma história verídica de uma família que se desloca do Nordeste para o Rio de Janeiro atrás do sonho de uma vida melhor. Ao abordar as migrações e a carência por que passam milhares de brasileiros, a produção do diretor Vicente Amorim ganha vulto e nos permite uma reflexão sobre os rumos de nosso país. Confiram!
O Filme
Romão (Wagner Ramos, em elogiada interpretação) é mais um desempregado que alimenta as estatísticas do desemprego no Nordeste do Brasil. Pai de cinco crianças e casado com Rose (Cláudia Abreu, mostrando toda a sua versatilidade), decide tomar o rumo do Rio de Janeiro e levar com ele toda a sua família. Até esse momento sua história é muito parecida com a de tantos milhares de nordestinos que partem em direção as metrópoles do Sul e Sudeste do Brasil, entretanto, Romão consegue convencer Rose a cruzar o país, com toda a prole, em cima de bicicletas.
Além de toda a complicação relacionada à viagem, é aconselhável lembrar que as crianças de Romão e Rose são ainda pequenas (um adolescente, três crianças entre 7 e 11 anos e um bebê de colo) e que, além disso, eles contam com apenas 5 bicicletas para 7 pessoas. A odisséia da família é feita com carga adicional para Romão (que carrega sua filha em sua bicicleta) e para Rose, que leva o bebê com ela.
A travessia de nosso país nos permite perceber a árida paisagem do Nordeste, composta por vegetação arbustiva, de poucos pontos de apoio (quase não há postos de gasolina, lojas, postos policiais ou mesmo cidades em boa parte do percurso). A escassez de recursos e a falta de condições de transportá-los obriga os viajantes a uma difícil luta pela sobrevivência. Para conseguir o pão de cada dia, novas agruras são passadas pelo grupo.
Singelo e tocante, “O Caminho das Nuvens” comprova a boa fase do cinema nacional. Além da migração ainda nos mostra a pobreza, a violência, a fome e os sonhos que alimentam as odisséias pelas quais passam tantas e tantas pessoas em nosso país. Marcado por boas atuações (prestem atenção no filho mais velho de Romão e Rose, Antônio, personagem de Ravi Ramos Lacerda, outro jovem promissor que já havia se destacado em “Abril Despedaçado”, de Walter Salles), com uma direção séria e competente produção, vale ser visto e revisto. Só há um porém em relação ao filme, ele é muito curto (aproximadamente 80 minutos), e acabamos sempre tendo a sensação de que faltou alguma coisa...
Aos Professores
1- Um exame das correntes migratórias que regularmente povoam as grandes cidades brasileiras poderia ser feito a partir da utilização do filme. Nesse estudo seria interessante que os alunos pudessem averiguar as condições de vida dessas pessoas em favelas e periferias. As possibilidades de sucesso e fracasso, os índices estatísticos referentes a poder aquisitivo, dados relativos a estrutura dos locais onde estão vivendo, histórico das famílias (onde viviam, porque vieram, o que esperavam, o que encontraram). Para tanto, o ideal seria uma pesquisa de campo, associada ao exame dos dados disponibilizados pelo IBGE. Seria possível conciliar a atividade associando os professores de matemática, história, geografia e português.
2- Um levantamento de histórias contadas por migrantes a jornalistas seria outro recurso/trabalho interessante. Ao serem pesquisadas e lidas essas histórias poderia ser realizado um trabalho comparativo entre os depoimentos extraídos de jornais e as imagens do filme. Como fechamento dessa proposta os alunos poderiam compor um texto coletivo, escrito por todos, cabendo a cada aluno a produção de um parágrafo ou de uma página, com base nos dados coletados nos jornais e no filme.
3- A miséria vivida por boa parte dos brasileiros é cotidianamente registrada por diversos órgãos noticiosos. Há muitas fotografias retratando a desgraça vivida por milhares de pessoas. O resgate e a editoração eletrônica dessas fotografias, utilizando-se os recursos disponíveis em softwares específicos para esse tipo de atividade, podem permitir aos alunos a produção de arte eletrônica. Para tanto seria fundamental a articulação dos esforços dos professores da área de códigos e linguagens (português, redação, artes) com os responsáveis pela informática na escola. Essa atividade poderia gerar uma grande exposição.
4- Poderiam ser feitas leituras paralelas de clássicos da literatura brasileira que demonstrassem as dificuldades vividas nas regiões mais áridas do país ou ainda na periferia das grandes cidades, superpovoadas de forma desordenada, sem que a infra-estrutura local possa suprir suas necessidades. Como exemplos de obras que poderiam ser utilizadas poderíamos sugerir “Os Sertões”, de Euclides da Cunha, e “O Cortiço”, de Aluísio Azevedo.
João Luís Almeida Machado
Mestre em Educação, Arte e História da Cultura (Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo);
Professor universitário atuando na Faculdade Senac em Campos do Jordão; Professor de Ensino Médio e
Fundamental em Caçapava, SP; Editor do Portal Planeta Educação
Ficha Técnica
O Caminho das Nuvens
País/Ano de produção: Brasil, 2003
Duração/Gênero: 85 min., Drama
Direção de Vicente Amorim
Roteiro de David França Mendes
Elenco: Cláudia Abreu, Wagner Moura, Ravi Ramos Lacerda, Sidney Magal,
Cláudio Jaborandy, Manoel Sebastião Alves Filho, Cícera Cristina Almino de Lima,
Francioly Luciano, Cícero Wallyson Ferreira, Cícero Wesley Ferreira.
Links
http://adorocinema.cidadeinternet.com.br/filmes/caminho-das-nuvens/caminho-das-nuvens.htm</a>- http://www.cinemaemcena.com.br/crit_editor_filme.asp?cod=2694
http://www.ocaminhodasnuvens.com.br (site oficial)
http://cineclick.virgula.terra.com.br/criticas/index_texto.php?id_critica=747
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